domingo, dezembro 23, 2007

Já chegou o Natal?

Você já ouviu inúmeras pessoas dizerem que o Natal já está em cima; que está próximo ou que já chegou. Talvez você mesmo esteja achando que faltam apenas dois dias para o Natal chegar, mas o fato é que ainda falta muito. Não para que estejamos vivendo o dia 25 de dezembro, mas para que vivamos de fato um tempo de Natal. Não me refiro às lâmpadas, árvores enfeitadas e gordos velhinhos alvirrubros. Falo de um tempo de fraternidade, de amor sincero e respeito pelas diferenças das pessoas. Tudo isso eu vejo encarnando junto com a Criança de Belém.

Quando o anjo Gabriel conversou com Maria lhe disse que o nome da criança que iria nascer deveria ser Jesus. Em sonho, José é advertido a chamar o bebê que estava para nascer também com o nome Jesus. O nome Jesus é a forma latinizada da expressão hebraica Yehoshua, que significa literalmente “Deus é salvador”. A salvação da qual nos fala este nome não tem apenas o significado de ser ele o “cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo”, como disse sobre ele João Batista. Em outros termos, Jesus não nos salvou apenas morrendo por nós e tomando sobre si os nossos pecados. Isto de fato aconteceu e devemos render graças ao Pai por enviar em nosso socorro seu Filho unigênito. Eu sou imensamente grato por este gesto supremo e eterno de amor.

Mas o que me encanta mesmo no fato de o Verbo Eterno de Deus ter vindo ao mundo e habitado entre nós é que ele nos ensinou que é possível viver de modo radical o amor e o respeito por todas as criaturas existentes. Jesus me salvou do cinismo, do desencanto para com a vida e com o próximo. Eu já vivi momentos em que me senti decepcionado com a humanidade, como se não valesse apena coexistir ao lado dos outros seres humanos. Nestes momentos, reconheço, estive cego para a minha própria indignidade e imperfeições, de que eu mesmo sou um ser com quem é difícil conviver, mas fui tão tomado pela frustração e tristeza que quase me desanimei.

Quando isso aconteceu foi importante olhar para Jesus não como um rei assentado em majestoso trono nos céus, ou um juiz impávido em sua cátedra de justiça e Lei. Foi indispensável e profundamente salvífico ver Jesus como um peregrino, exatamente o que eu sou, que convidou homens e mulheres para caminharem ao seu lado e que manteve com estas pessoas um relacionamento que lhe provocou tristeza, dor e descontentamento. Ele me mostrou como se deve agir em momentos assim. Foi vital ouvi-lo dizer: “Pai, perdoa-lhes este pecado, eles não sabem o que estão fazendo...”. Sei que Jesus continua dizendo tais palavras ao Pai olhando para mim e para a minha vida, mas, sobretudo, sei também que é isso que ele quer ouvir dos meus lábios quando os meus irmãos agem contra mim.

O problema é que em mim ainda falta muito para ser Natal, noutras palavras, ainda demora para que o amor de Deus encarne em mim. Para que eu tenha a experiência plena da divindade em mim. Hoje eu ouvi um irmão dizer algo lindo, de modo absolutamente despretensioso. Ele disse que Deus nos deu a possibilidade de termos um pouco da sua própria natureza vivendo em nós. E explicou: se Deus é amor, todos aqueles que amam manifestam o Deus que habita dentro deles. Isto é verdade! João nos disse isso em sua primeira epístola de modo expedito e claro: “Amados, amemo-nos uns aos outros, porque o amor procede de Deus; e todo aquele que ama é nascido de Deus, e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor” 1 Jo. 4:7 e 8.

Dizer que é Natal é dizer que o amor se encarnou, que é possível sentir o cheiro do amor, andar com ele, tomá-lo em nossos braços. Mas onde está o amor? Nos templos ou nos palácios? Nas sinagogas ou nas catedrais? Nos parlamentos ou nos tribunais? Eu já estive em todos estes lugares, me assentei com os poderosos que ali exercem seus ofícios e posso lhes dizer: ali não há amor. No máximo encontraremos um interesse utilitarista pela vida uns dos outros. Uma espécie de redução da vida alheia a mecanismos de autopromoção e exploração. Onde há egoísmo não pode haver o verdadeiro amor. Parece que estamos na mesma enrascada dos magos vindos do Oriente. Queremos ver Aquele que é amor entre nós, mas não sabemos onde achá-lo. Os céus proclamam que ele nasceu, mas onde estará escondido? Inutilmente vasculhamos as casas dos poderosos deste mundo, como o palácio de Herodes, mas o amor não está lá.

Tive uma idéia, quem sabe o achemos... Que tal procurar nos quintais, nas estrebarias, nos currais da existência. Não foi somente lá que José encontrou lugar onde acolher a sua esposa e seu filho, prestes a nascer? Talvez seja, ainda hoje, somente lá que encontremos o amor encarnado entre os homens. Não podemos comemorar o Natal antes que ele chegue. Não podemos dizer “Feliz Natal!”, se nem sabemos se Natal será. Creio que mais do que comemorar o Natal, os homens de nossos dias deveriam aceitar o desafio de “Fazer Natal!”, ou seja, vamos deixar encarnar em nós a essência de Deus, este amor absurdo e descomensurado por todas as criaturas, particularmente, por todos os homens e mulheres. Vamos chamar a todos de “meu irmão!”, “minha irmã!” e tratá-los com o amor, com o carinho e com o respeito que tal nomenclatura designa, assim, quem sabe hoje, será Natal.

Fazer Natal!

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@martorelli.org
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domingo, dezembro 16, 2007

Uma Revolução Simbólica

Tudo quanto existe no mundo natural foi criado por meio da palavra. Segundo a narrativa do livro de Gênesis, disse Deus “haja!” (Gn. 1) e as coisas passaram a existir. Do mesmo modo o evangelho de João nos ensina que “no princípio era a Palavra (o Verbo), a Palavra era Deus e a Palavra estava com Deus. Todas as coisas foram feitas por causa da Palavra e sem ela nada do que foi feito se fez” (Jo. 1). Vendo por este prisma, não podemos ser daqueles que dão pouca ou nenhuma importância ao que se diz.
Além do mundo físico está o universo simbólico, que é composto de nossas representações discursivas e do imaginário, mas permeando e influenciando a esfera concreta das coisas que são. Dar menos importância a isto do que àquilo que chamamos de ‘realidade’ é esquecer o que falamos acima, de que todas as coisas nascem de uma fonte verbal e se condensam na concretude do real. Logo, há uma semente de realidade naquilo que se diz.
Jesus estava extremamente preocupado com aquilo que seus discípulos falavam. Nem um nem duas vezes ele os ensinou sobre o que convém dizer e o que convém não dizer. Ele disse que ao chegar numa casa eles deveriam saudar os que ali habitam dizendo “Paz seja nesta casa!” (Lc. 10:5), afirmando ainda que se houver na casa pessoas dignas da paz que se deseja, esta descerá sobre ela, caso contrário, “a vossa paz tornará para vós”. Não é apenas um conjunto de palavras é uma prenda, um presente, uma dádiva viva.
Noutra ocasião ele advertiu aos seus discípulos para que não julgassem a seus irmãos (Mt. 7:1), porque se assim eles procedessem estariam construindo um ambiente tribunalesco, em que eles mesmos seriam colocados na condição de réus, mais cedo ou mais tarde. Além disso, destacava o fato de que eles e nós não somos dignos de julgar ninguém, uma vez que somos acusados também por nossa própria consciência (“quem não tiver pecado que atire a primeira pedra” Jo. 8:7).
De tudo isso nós estamos bem lembrados e, posso afirmar, que estas verdades têm sido ensinadas na maioria das igrejas cristãs de nossos dias. Mas há algo que tem sido completamente esquecido. Aquilo que Jesus com palavras claríssimas ensinou e que está registrado no capítulo 23 do evangelho de Mateus, nos primeiros dez versículos:
“Então, falou Jesus às multidões e aos seus discípulos: Na cadeira de Moisés, se assentaram os escribas e os fariseus. Fazei e guardai, pois, tudo quanto eles vos disserem, porém não os imiteis nas suas obras; porque dizem e não fazem. Atam fardos pesados [e difíceis de carregar] e os põem sobre os ombros dos homens; entretanto, eles mesmos nem com o dedo querem movê-los. Praticam, porém, todas as suas obras com o fim de serem vistos dos homens; pois alargam os seus filactérios e alongam as suas franjas. Amam o primeiro lugar nos banquetes e as primeiras cadeiras nas sinagogas, as saudações nas praças e o serem chamados mestres pelos homens. Vós, porém, não sereis chamados mestres, porque um só é vosso Mestre, e vós todos sois irmãos. A ninguém sobre a terra chameis vosso pai; porque só um é vosso Pai, aquele que está nos céus. Nem sereis chamados guias, porque um só é vosso Guia, o Cristo”.
A verdade e atualidade destas palavras são constrangedoras. Eu as leio com vergonha e um profundo sentimento de arrependimento. Elas se aplicam perfeitamente a mim. Eu fui assim e ainda estou tentando deixar de ser. Que o Senhor tenha misericórdia de todos nós! Em nossa presunção, cegueira e orgulho assumimos o lugar de Deus e deixamos de reconhecer que somos suas criaturas e seus filhos, que somos todos (todos mesmo!) irmãos. É assim que Jesus desejou que nos chamássemos: irmãos. Nem de pastores, presbíteros, reverendos, padres, guias ou quaisquer outros títulos, os quais iludem os homens e obliteram a fascinante e libertadora verdade de que somos iguais, com virtudes e fraquezas, com esperanças e desencantos, com dias bons e maus.
Há dois tipos de espíritos fracos que carecem destas estruturas hierárquicas para se sentirem seguros e felizes. Aqueles que precisam ser tratados com distinção, deferência e especial respeito para se sentirem, ainda que só um pouco e por um pouco de tempo, especiais. E aqueles que necessitam ter a estas pessoas sobre si para se sentirem protegidos e guiados neste mundo confuso. Não são poucas as pessoas que se enquadram nestes dois perfis, mas eu oro ao Senhor para que nos transforme em uma comunidade de pessoas crescidas, que sabem (e fazem questão de não esquecer) que somos apenas companheiros de peregrinação. Todos viajantes, que se alegram por não terem que caminhar sozinhos, que cantam com contentamento seus louvores porque isto traz saúde e paz.
Ninguém precisa ser maior e melhor, nem menor e pior do que eu para andar comigo, até porque, se olharmos para dentro das pessoas notaremos que tais diferenciações são meramente resultado de nossos preconceitos e preferências pessoais. Acredito que chegou o tempo de realizarmos uma revolução simbólica no meio cristão. Revolução sim, mas não uma novidade. Esta mesma radical mudança já foi operada muitas vezes na história da Igreja, começando com Jesus de Nazaré, que não era nem sacerdote, nem levita, nem escriba, nem doutor da Lei, era apenas carpinteiro. Ele é o nosso mestre. O Espírito de Deus é o nosso Mestre. Ele é o nosso Pastor e Guia! Creiamos nisso e vivamos em amor, como seus discípulos e irmãos uns dos outros.
Lembro também que Francisco de Assis empreendeu em seus dias uma viragem semelhante. Num mundo medieval cheio de autoridades eclesiásticas e títulos de nobreza, ele teve a coragem de ser apenas “Frei Francisco”, irmão Francisco. Gostava que lhe chamassem de “fratello”, de irmãozinho; de “povorello”, o pobrezinho. Deste modo, queria se fazer irmão de todos, mas, principalmente dos mais pobres de seu tempo. Pregava vestido de trapos e descalço, como qualquer pedinte. No momento de sua morte pediu para que seus irmãos o colocassem no chão, para que morresse como morrem os indigentes. Era assim que ele se considerava, tomado por um profundo sentimento de pecado, mas que contrastava com seu imenso amor para com todas as pessoas, e até mesmo para com todas as criaturas de Deus.
O meio religioso está repleto de pop-stars, homens e mulheres que são shows ambulantes. Que Deus nos livre disso! Que entre nós só o Senhor seja a estrela e que só o Espírito seja glorificado. Escolhi três palavras que devem ser os signos de nossa Comunidade: fraternidade, simplicidade e serviço. Ajuda-nos Jesus a sermos assim!

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@martorelli.org

quarta-feira, dezembro 05, 2007

Em Busca da Morenidade Perdida

Algumas pessoas me perguntaram o que eu queria mesmo dizer com a expressão “uma igreja morena”. Por igreja morena eu pretendo definir uma comunidade cujos traços essenciais são não apenas brasileiros, nordestinos e recifenses, mas também litorâneos e contemporâneos. Um grupo de irmãos que aceitou o seu tempo e espaço, que não está vinculado a algum momento do passado, tendo eleito um período da história da humanidade como o mais feliz, mais fecundo e mais apropriado para se viver; fazendo agora todo esforço para se reportar moral, teológica, ideológica e esteticamente à este período.

Quero que sejamos gente daqui e de agora, mas, simultaneamente, pessoas que vivenciam o mistério da contínua encarnação do Verbo. Se a igreja é o “corpo de Cristo”, este precisa estar em constante processo de humanização, de descer e fazer-se menino entre nós. Aqueles que seguem o Caminho precisam ser capazes de não apenas falar a língua de seus semelhantes, como também de imiscuir-se em sua cultura e, a partir dela, anunciar as boas novas de que Deus ama o pecador, que não está zangado com ele, que o quer bem perto de Si. Que o Senhor ama fazer festas e que não há uma só alma que se volte para Ele sem que isto produza nEle vontade de música, de danças e banquetes.

Não foi isso que nos ensinou a parábola do Filho Pródigo? Que Deus está à espera que seus filhos voltem, para que os músicos comecem a tocar e que as chamas do churrasco a crepitar? Quero viver esta festa, quero dançar no baile dos arrependidos, um baile sem-máscaras e, por isso mesmo, absolutamente desconcertante. Antigamente as pessoas viviam sem-máscaras e, de vez em quando, colocavam uma para um momento especial. Hoje vivemos de máscaras (inclusive eu) e as tiramos raramente em ocasiões singulares. A festa do amor de Deus tem o requinte, o glamour e a sofisticação de um baile sem-máscaras. Evento raro em nossos dias.

Se você leu estas últimas palavras e ficou pensando: Martorelli está se referindo a fulana e a beltrano... Então não entendeu nada do que é ser uma igreja morena. Nossa morenidade se expressa em nossa preocupação com o tempo presente, o lugar presente e as pessoas presentes. Se estamos nos reportando ao passado e aos indivíduos que no passado fizeram parte de nossas vidas é porque somos gente de ontem e este tipo de pessoa não é morena. Conheço homens e mulheres em nossa Comunidade de pele bem clarinha, de olhos e cabelos alvos, mas com uma alma morena. Identifico no mundo seres ‘bem-passados’, como eu, mas cujos sentimentos ainda não se tornaram morenos.

Um dia todos nós fomos morenos, mas com o tempo nos esquecemos disso. Foi uma época em que a classe social, a cultura, o poder político de alguém não importava nada. O que interessava mesmo é que tinha aparecido mais uma pessoa para brincar de esconde-esconde ou pular corda. Um tempo em que a nossa memória era tão curta como a de um menino de cinco anos que diz pro amiguinho: “nunca mais... nunca mais em toda a minha vida eu vou brincar com você”. E que cumpre a promessa durante os três próximos minutos, até que uma bola corra na campina ou que a tia chama para comer biscoito com suco de laranja. Aí é só abraço e amizade, coisas morenas.

Quando Deus quis que o seu Filho viesse ao mundo, escolheu uma moça, virgem de alma, corpo e coração, uma menina morena. Depois que ela deu à luz o seu primogênito muitas coisas aconteceram. Seu coração amoroso e simples foi ferido pelos golpes da injustiça e da ingratidão. Seu rosto doce e meigo foi sulcado pelas torrentes de lágrimas que de seus olhos brotaram. Sua voz, antes sempre embalada por cantigas de roda, aprenderam a exprimir o inexprimível em gemidos solidários àquele que de si saíra, mas de si nunca partira. Nem sei porque chamam ‘parto’ o nascimento de uma criança, elas nunca partem. Deve ser porque se partem os pais e começam a viver não mais apenas suas vidas, mas tantas quantas deles partiram.

Maria-mulher é em tudo diferente da Maria-menina, só uma coisa nunca se perdeu, foi sempre morena. Vejo-a morena no cântico que compõe para exaltar a Deus pelo anúncio que recebera de que seria mãe do Salvador; é morena no templo ouvindo as profecias de Ana e Simeão; em sua solicitude e disponibilidade para que a festa não acabe por falta de vinho nas bodas de Caná da Galiléia, mas vejo-a assim, sobretudo, ao pé da cruz... sem desespero, sem ansiedade, sem ódio ou cólera... só dor e silêncio, como se soubesse o que sabiam os amigos de Jó, que quando a dor é muito grande não importam palavras, mas é indispensável e impossível de avaliar a importância de uma presença amiga.

Domingo, quando os vi neste auditório do Hospital de Aeronáutica, vocês que aqui não precisavam estar. Que abriram mão do conforto e da segurança para me acompanharem nesta insólita aventura que é plantar não apenas uma nova igreja, mas um jeito novo de ser igreja, me dei conta que vocês são morenos; de que se eu quiser escolher modelos de morenidade basta tomar aleatoriamente a mão de qualquer um que caminha conosco e colocá-lo de pé; que quem mais precisa aprender aqui sou eu. Eu que ainda não sou moreno, mas que estou pegando sol pra caramba! Muito obrigdo!

Sou grato ao Senhor pela semente que nos deu. Pelo Menino-Moreno que foi adorado pelos magos, pastores e anjos, seres em tudo diferentes, mas tão iguais quando se prostram diante dAquele que do pouco faz muito, que do enfermo faz são, que do só faz guia, que da água faz vinho, que do pão faz corpo, que da dor faz esperança, que do começo faz vitória. Glórias, honras e louvores unicamente ao Seu nome que é santo, puro e perfeito. Que sendo Deus, não julgou ser humilhante demais, por amor, fazer-se homem, posto que nada é humilhante demais se é feito por amor. Ele, morrendo moreno, nos fez filhos de Deus. Aleluia!!!

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@comunidadecrista.org

sábado, dezembro 01, 2007

O que é a Comunidade Cristã?

1. É só UMA comunidade de cristãos reunidos para cultuar ao Deus Vivo
2. Que têm suas marcas essenciais na inclusividade e no amor ao próximo
3. Que confessam a Jesus como caminho de salvação e redenção de todos os homens
4. Que encontram no Evangelho de Jesus um convite para a vida e para a fraternidade
5. Que reconhecem os terríveis efeitos dos pecados do desamor e da indiferença
6. Que afirmam como mandamento supremo o amor a Deus, a si mesmo e ao próximo
7. Que abrem mão de toda forma de julgamento dos semelhantes
8. Que buscam um relacionamento fraterno com líderes e outras comunidades cristãs
9. Que reconhecem e celebram os sacramentos do batismo e da eucaristia
10. Que são dirigidos de modo conciliar
11. Nela todos são leigos e sacerdotes, simultaneamente
12. Nela os dons do Espírito Santo são expressos com ordem e decência

O que não é a Comunidade Cristã?

1. Não é uma denominação nem está ligada a qualquer grupo denominacional
2. Não pretende plantar igrejas nem se espalhar pelo mundo
3. Não busca atrair para si cristãos de outras comunidades
4. Não tem nem buscará qualquer vinculação política
5. Não reconhece qualquer distinção qualitativa entre os seres humanos
6. Não busca a aquisição ou acúmulo de bens nem patrimônio
7. Não vê sentido em nada que não esteja sendo usado para servir ao próximo
8. Não adora nem cultua senão ao Deus Pai, Filho e Espírito Santo
9. Não nega a participação dos sacramentos a quem quer que seja
10. Não reconhece o caráter revelacional das culturas humanas
11. Nela os ministros são canais de graça, não autoridades religiosas
12. Nela não se reconhecem barreiras denominacionais, mas a cooperação dos cristãos
Nós estamos aqui e um dia vamos ter o prazer de dizer: Eu estava lá!

É uma experiência fantástica dar à luz a uma vida. Ver nascer um novo ser surgindo de nossas próprias entranhas, vingando apesar das intempéries, enchendo de brilho, alegria, sorrisos e brinquedos este mundo tão carente de gargalhadas simples, transbordantes e sinceras. Ver crescer entre nossas mãos e joelhos uma nova pessoinha com uma personalidade toda sua, um timbre de voz peculiar e cheiro de alma nova. Senti isso muitas vezes em minha breve existência. Foi assim quando chegou Thiago, depois Thalita e Thainá, foi assim também outras centenas de vezes em que contemplei aqueles que se encontraram com Cristo e sentiram surgir dentro de si uma nova capacidade de emoção ante as realidades do Espírito.

Hoje estamos vendo nascer uma Comunidade Cristã. Isto acontece aqui, nesta terra sagrada do Hospital de Aeronáutica, posto que não é menos que sagrado qualquer lugar onde se dá cotidianamente o milagre da vida. Distante poucos metros daqui, na maternidade do hospital, nasceram meus sobrinhos Heitor e Arthur. Eu estava aqui! Nunca vou esquecer-me disso. Estamos vivendo um momento assim, mágico e inesquecível. Daqui a muitos anos vamos dizer aos nossos netinhos: Eu estava lá! Veja, este foi o boletim que distribuíram no primeiro encontro da Comunidade Cristã. Tá vendo? Eu estava lá!

Mas não se engane! Ela não ganha vida diante dos seus olhos. Você não é meramente uma testemunha de um acontecimento em relação ao qual não tem outra responsabilidade senão aquela de felicitar os afortunados pais. A Comunidade Cristã está nascendo com você, através de você e dentro de você. Nossas vidas nunca mais serão as mesmas a partir de hoje. Antevejo muito trabalho, noites mal-dormidas, instantes em que nos perguntaremos: o que fazer? Nem precisa se assustar, é assim, nada que amamos nasceu grande, mas desde que nasceu fez surgir em nós esta certeza de que é para sempre. Hoje é pra sempre, e pra sempre é muito tempo!

Nossa Comunidade, pequena e humilde, vem ao mundo como Aquele a quem servimos e proclamamos. Caminharemos como fizeram os magos, seguindo uma estrela que nos conduzirá passo-a-passo, decisão-a-decisão, encontro-a-encontro. Ela nasce nesse canto que não é seu, já na certeza de que aqui não é pra ficar. Estamos de passagem, como Jesus e a Sagrada Família, peregrinando em pleno mês de dezembro. Talvez tenhamos que ir para o Egito, fugindo de quem intenta nos tirar vida. Mas, como foi com José, pai por adoção do Menino Deus, se um sonho nos leva, outro sonho nos faz voltar.

E que sonho..... creio que toda a minha vida sonhei com uma igreja como esta que vemos se entretecer em nosso meio. Marcada pela fraternidade, pela simplicidade e pela fidelidade. Sem prata nem ouro, mas com confiança suficiente em Deus para dizer a este mundo paralítico: LEVANTA! – não se deixe levar pelo abatimento, pela frustração, pela sensação de impotência ante a injustiça; mas ANDA – coloque-se em marcha, mexa-se, mude as coisas, deixe suas próprias pegadas no chão sempre virgem da praia lambida pelo mar.

Seguiremos o nosso itinerário, seja ele qual for. Sei tanto sobre o nosso futuro quanto qualquer um de vocês. Mas sei também que não é preciso saber. O nosso Pastor está no comando, Ele mesmo nos conduzirá. Já foram tantas maravilhas até aqui, muitas outras virão do alforje do único que sabe por onde iremos, em que ritmo e na companhia de quem. Ele nos uniu e vai trazer no tempo certo todos aqueles que devem, precisam e importa caminhar conosco. Quanto a nós... vamos pregando, amando, servindo, rindo, brincando. Existindo como crianças que somos, nas infindas aventuras que a existência nos proporciona.

Mas para que ninguém pense que eu não carrego certezas; que nada sei sobre a nossa vida e caminhada, aproveito a oportunidade para apresentar a todos vocês o meu precioso conjunto de três certezas: (1) eu sou pecador; (2) Deus me ama mesmo assim; (3) no final, depois de tudo, Ele virá e me abraçará e este abraço nunca terá fim. Bem, mas o que isso tem a ver com a Comunidade? Muito. Elas podem ser traduzidas em termos comunitários nestas outras três poderosas convicções: (1) em nossa comunidade ninguém vai ser perseguido, desrespeitado ou maltratado por ser pecador. Nós somos pecadores; (2) todas as pessoas que aqui entrarem, vindas de onde vierem, marcadas seja por que tragédia for, serão amadas, acolhidas, tratadas e restauradas, porque Deus nos ama mesmo assim; (3) no final – sempre há um final – será o abraço, muitos abraços... mais abraços. Verdadeiros e íntimos como o Eterno Abraço.

Cantemos juntos por uma vida morena!

Tu és Fiel Senhor!

Com carinho,

Martorelli Dantas

quinta-feira, outubro 25, 2007

Entre Saber e Crer

O que são doutrinas? São construções humanas que afirmam como verdade um determinado arranjo lógico que faz afirmações sobre elementos teóricos ou práticos. Se pensarmos deste modo, podemos afirmar que existem doutrinas em todas as áreas do conhecimento. Seria razoável, portanto, falar em doutrinas jurídicas, médicas, filosóficas, sociológicas etc. Mas em teologia as doutrinas ocupam um lugar especialíssimo, isto porque as teologias, em geral, nada mais são do que feixes de doutrinas, arrumados de acordo com as preferências dos doutrinadores, numa relação dialética com seus discípulos, críticos e com o seu público alvo.
É extremamente complexo afirmar se uma doutrina teológica é ou não verdadeira. Primeiro, é preciso se afirmar que não apenas cristãos fazem teologias. Todo esforço religioso finda por construir um acervo doutrinário como resultado das interações, reflexões e experimentações dos indivíduos inscritos na tradição religiosa. Em segundo lugar, é fato que os critérios de validação das doutrinas teológicas são produzidos autopoieticamente (por si, dentro de si e para si) pela própria religião. Logo, estamos num universo marcado pela arbitrariedade, ou para sermos mais precisos no linguajar filosófico, estamos diante de uma ‘petição de princípios’: algo que diz que aquilo que se afirma é verdade, em última instância, porque se afirma que é verdade. Este tipo de mecanismo lógico foge à possibilidade de verificação e é auto-justificável.
Quando as doutrinas teológicas invocam para si uma veracidade ou validade baseada na revelação do divino, nada mais estão fazendo do que demonstrar, in extremis, que não se pode sustentar logicamente a validade e veracidade de algo que se diz no campo da teologia. Um expediente largamente utilizado neste ambiente é sustentar as afirmações a partir da interpretação de textos sagrados, como a Torá, Bíblia ou Corão. Isto só aumenta o grau de complexidade de tais assertivas, porque duplicam a problemática. Resta saber, agora, não apenas se as afirmações do texto sagrado são verdadeiras (o que só se pode saber assumindo uma relação com crer ou não crer na revelação), mas se as interpretações construídas sobre estas afirmações são hermeneuticamente razoáveis.
Sem querermos nos aprofundar nas problemáticas infindas das regras de interpretação, nos limitaríamos a dizer que ‘regras de interpretação’ são doutrinas. Assim, há pelo menos um corpus hermenêutico em cada tradição religiosa, e este não deve obediência a nenhum critério externo, nem mesmo aos padrões filosóficos universalmente aceitos e conhecidos. Até porque não existem ‘padrões filosóficos universalmente aceitos e conhecidos’. Sendo assim, o que nos resta em termos de saber teológico, uma vez que não é possível assentir com uma afirmação doutrinária pela via exclusiva da razão? Resta-nos, creio eu, a experiência mística.
Por ‘experiência mística’ pretendo descrever o fenômeno que se dá no interior do ser e que é absolutamente pessoal e intransferível. São exemplos de tais experiências a consciência de pecado, a percepção da presença de Deus em algum lugar, a adoração, a convicção interior de idéias concluídas, inferidas ou transmitidas. Deste modo, no campo da teologia é necessário que primeiro se creia para que depois se saiba. Só se sabe como verdade algo, porque se pressupõe a legitimidade e veracidade do mestre, do texto e das lições que destes se recebe. Não fique triste nem deprecie a teologia por serem assim as nossas relações com as doutrinas, porque, com mais ou menos intensidade, se pode dizer o mesmo sobre todas as outras formas de conhecimento já referidas acima.
Mesmo as ciência chamadas ‘duras’, cuja base está na observação dos fenômenos de acordo com metodologias explícitas e rigorosas, exigem um ‘acordo’, um consenso prévio sobre conceitos basilares e um modo comum de interpretar os seus objetos e os resultados de suas experimentações. Freqüentemente, estes acordos se revelam no decorrer do tempo como errados ou precários, são suplantados por novas pesquisas, as quais cristalizam novos acordos, novos consensos. Isto posto, nada se sabe sem que se creia e a fé é o resultado de uma experiência tanto pessoal quanto transformadora. É por esta razão que Jesus não nos mandou ser mestres, mas testemunhas. Não pessoas que ensinam o que sabem, mas que contam o que viveram, que experimentaram.

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@reconciliacao.org

sexta-feira, agosto 10, 2007

Paternidade X Paternalismo

Há um antigo slogan publicitário que diz ‘não basta ser pai, tem que participar’, mas resta saber o que vem a ser esta participação paternal. Para alguns, implica em cuidar dos filhos, suprindo suas necessidades e estar presente nos momentos mais importantes de suas vidas. Para outros, consiste em ser partícipe dos brinquedos da infância, das alegrias da adolescência e das aventuras da juventude. Talvez seja um pouco de tudo isso, ou quem sabe vá além destas coisas, alcançando limites mais íntimos e elevados da natureza das pessoas. O que é certo, é que os pais de nossos dias não conhecem claramente seus papeis e limites.

Somos inclinados a viver com um sentimento de culpa constante. Como se estivéssemos roubando os nossos filhos quando nos damos ao trabalho, quando nos divertimos com o cônjuge e amigos ou quando investimos em nossos estudos e qualificação profissional. Os filhos se converteram em credores tácitos. São nossos eternos cobradores. O nosso relacionamento passou a se basear num desejo de ressarcimento da impagável dívida que, inexplicavelmente, contraímos com eles.

Cumpre investigar as causas emocionais e psicológicas deste sentimento. A primeira hipótese a ser visitada é a de que o modelo de paternidade que recebemos de nossos próprios pais é em tudo mais elevado que aquele que conseguimos por, efetivamente, em prática. Daí que comparando o que foram para nós os nossos pais e o que somos nós para os nossos filhos, é que chegamos à conclusão que somos e damos menos dos que recebemos. Dificilmente eu poderia aceitar esta tese. Os pais da década de 60 e 70 eram muito menos sensíveis às demandas dos filhos do que somos hoje, falando de um modo genérico. Sua participação no dia-a-dia dos filhos estava muito mais ligada ao exercício de disciplina e punição que ao diálogo e gestos de ternura.

É deste ponto que podemos partir para uma segunda hipótese. A de que tendo recebido pouco em termos de afabilidade e oportunidade para conversas francas e pacificadas, decidimos que daríamos muito mais aos nossos filhos. Estabelecemos para nós mesmos padrões idealmente construídos aos quais não conseguimos honrar. Seria esta a fonte primária de nosso remorso, de nosso débito para com os nossos filhos. Pesa contra isto, o fato de que devemos ser capazes de readequar expectativas, de calibrar o que esperamos de nós com aquilo que podemos dar. Não seria razoável que toda a nossa geração fosse vítima deste mesmo descompasso entre o compromisso pessoalmente construído e o que entregam concretamente a seus filhos.

Chegamos agora em nossa investigação àquela razão que me parece a verdadeira vilã de nosso drama. Creio que o que a sociedade, inclusive alguns psicólogos e pedagogos, espera de nós é paternalismo e não paternidade. Qual a diferença entre estes dois conceitos? Basicamente eu diria que a paternidade se caracteriza pela doação para que o outro seja, enquanto o paternalismo se estrutura num esforço de ser pelo outro para que possamos lhe dar. O sentimento de débito imenso que vem crescendo em nós, resulta, penso eu, no modelo, inconscientemente aceito, de que devemos oferecer aos nossos filhos nossas mentes e corações para que neles se processem as experiências deles. De tal modo, que a nossa ausência implica, segundo acabamos crendo, no furto da possibilidade mesma de se darem estas experiências.

Em outras palavras, se não brincarmos não há brinquedo; se não estudarmos juntos não há obrigação de estudar; se não estivermos presentes para consolar quando as lágrimas dos desencontros amorosos brotarem, somos os culpados por elas. E os exemplos seguem até a náusea. Tornamos-nos mais essenciais aos nossos filhos do que realmente somos. E o pior é que incutimos neles estes conceitos, dando-lhes o direito de nos cobrarem o que não temos obrigação de lhes dar. Os tratamos como credores e eles aprenderam a nos tratar como devedores e não como doadores. O resultado disso é que eles crescem revoltados, porque não lhes demos o que era “seu direito”, enquanto morremos frustrados e culpados, querendo dar o que temos e o que não temos na ânsia de sermos perdoados.

Hoje é dia dos pais e eu gostaria de convidar os meus colegas genitores a repensarem tudo isso. Carrego em meu coração uma grande gratidão em relação ao meu próprio pai, que sempre foi provedor e leal a mim e aos meus irmãos. Mas ele soube me deixar ao sabor de minhas próprias experiências. Esteve suficientemente distante para que eu pudesse aprender a ser eu mesmo, a gestar no útero de minhas pessoais contradições o sêmen do homem que sou. Que Deus me ajude a dar o mesmo espaço aos meus filhos.
Sem culpa,

Martorelli Dantas
martorelli@reconciliacao.org

segunda-feira, junho 18, 2007

Jesus é leigo nisso...

Uma expressão simples como esta (Jesus é leigo nisso...), pode criar grande desconforto, isto porque a primeira idéia que nos vêm à cabeça quando ouvimos ou lemos o termo ‘leigo’ é a de alguém que ignora ou desconhece detalhes técnicos de alguma especialidade do saber. E tendemos a considerar que Jesus em seu estado glorioso, restituída toda a majestade de que se revestia antes da encarnação, tem pleno conhecimento de todas as coisas. Contudo, há outro significado para a palavra leigo na qual o Mestre se vê continuamente confinado.
Antes de tentarmos explorar esta acepção da palavra, bom seria que pudéssemos visitar a sua origem. ‘Leigo’ vem do latim laicos, que por sua vez resulta da romanização da expressão grega laos, que significa povo. O que se depreende deste caminhar do vocábulo é que em sua pré-história ‘leigo’ significa alguém que é do povo, ou que não se distingue deste por qualquer qualidade singular. É neste sentido que dizemos que a igreja se divide em clero (conjunto de pessoas revestidas de autoridade sacerdotal, tais como padres, pastores, bispos, arcebispos etc.) e leigos (o somatório de todos aqueles indivíduos que não se encaixam no primeiro grupo).
Esta separação no corpo da igreja é expressão da aplicação nela da estrutura organizacional do mundo judeu do primeiro século. Lá tínhamos o clero (composto pelo sumo-sacerdote, por sacerdotes e levitas) e tínhamos as autoridades doutrinárias e dogmáticas (formada pelos escribas e doutores da Lei), as quais eram vinculadas às diferentes seitas judaicas que pululam no tempo de Cristo e mostram sua face nas páginas dos evangelhos (fariseus, saduceus, essênios, zelotes e herodianos) e o povo em geral. Folheando as páginas dos quatro testemunhos neotestamentários da vida de Jesus o encontramos em constante diálogo (pra não dizer conflito) com estas figuras, particularmente, com os fariseus e seus escribas.
Quando afirmamos que Jesus é leigo, queremos nos referir ao fato de que, considerando tal estratificação da religião judaica do tempo da plenitude (como Paulo chama em Gl. 4:4), ele não se encontra nem entre o clero, nem entre os doutores da Lei. O fato inconteste é que ele é um homem do povo, filho de uma casa simples, que nasce numa estrebaria de Belém e vive numa cidade não muito melhor do que ela, que é Nazaré. Cresce como um menino judeu e faz a sua cerimônia de maioridade aos 12 anos, como é costume até hoje e aprende um ofício, se torna carpinteiro, seguindo aquela ocupação que era tradição familiar.
Não apenas era leigo, um homem do povo, mas quando empreende a vocação de seus doze seguidores mais próximos, vai buscá-los nesta mesma larga faixa da sociedade. Chama pescadores, cobradores de impostos e outros trabalhadores braçais e figuras polêmicas aos olhos dos religiosos, como o eram os publicanos. Eram todos galileus, seus vizinhos e discípulos de João Batista, seu primo. Indubitavelmente notamos que as bases da igreja cristã são lançadas sobre as figuras dos leigos, e isso não é acidental, mas programático.
O que Cristo parece querer evitar é que o vício que dominava as estruturas religiosas instituídas contaminasse o germe de seu movimento de redignificação do homem e de restauração de sua integridade diante de Deus, por meio do derramar gracioso de seu sangue sobre os santos. A laicização do corpo da igreja tem como proposta a distinção unicamente carismática (relativa ao karis, graça ou dom em grego) de seus membros, ou nas palavras de São Paulo, a compreensão que a distinção entre os elementos da igreja é funcional e não essencial, como se alguns tivessem mais ou menos prerrogativas diante de Deus e de seu corpo, que é a igreja.
O que aconteceu e já começa a se manifestar no livro de Atos dos Apóstolos, é que as perguntas sobre ‘quem é o maior’, feitas pelos discípulos a Cristo e divinamente respondidas por ele, começam a gerar uma hierarquização que tem como primeiro marco a instituição dos diáconos em Atos 6, os quais são estabelecidos para que os apóstolos não precisem deixar o ensino e a oração para servir às mesas. Estes, os diáconos, logo são vistos eles mesmos como autoridades da igreja, o que fica claro pelo destaque dado a Estevão e Filipe nos capítulos seguintes do registro.
Quando chegamos nas epístolas paulinas esta estrutura já aparece com um elemento a mais de complexidade. Paulo se vê na condição de apóstolo e comanda figuras como Tiago e Timóteo, os quais na condição de bispos, vão estabelecendo presbíteros e diáconos em cada igreja. Logo, o que temos é uma estrutura clerical nascente que já se divide em apóstolos, bispos, presbíteros e diáconos, antes que deixemos o terceiro quartel do primeiro século. A igreja cristã não foi nem um pouco econômica na criação de cargos e titulações honoríficas ao longo dos próximos séculos. Hoje são tantos que, mesmo pastores como eu, têm dificuldades em compreender precisamente o papel e trabalho de figuras como cônegos e arcediagos.
A pergunta que nos parece inevitável é se isso se dá como um desdobramento ou um desvirtuamento do legado de Jesus? A resposta que eu dou a esta indagação é que ambas as alternativas são verdadeiras. É desdobramento porque me parece inevitável que um ajuntamento como a igreja se desenvolva sem que, simultaneamente, tenha que fazer crescer em complexidade suas estruturas de controle e expansão. Mas é desvirtuamento porque a igreja não poderia ter perdido de vista a necessária e contínua tensão entre o ser e o não ser da semente deixada por Jesus, ou seja, lembrar que aquilo que somos como parte do corpo de Cristo, o somos mercê da manifestação em nós de sua graça, pois não somos na perspectiva pessoal e individual...não somos nem dignos, nem aptos pras incumbências sobre nós impostas, razão pela qual não podemos prescindir da direção e unção do Espírito.
A postura adotada pelos reformadores do século XVI, tais como Lutero e Calvino, partia da percepção de que uma casta de indivíduos não poderia arvorar para si a prerrogativa de serem os representantes de Cristo sobre a terra, levando-os a levantar a bandeira do ‘sacerdócio universal dos crentes’, pelo qual todo cristão deve se considerar um sacerdote, no sentido de que não precisa de nenhuma assistência especializada para buscar a Deus e alcançar o perdão para os seus pecados. Não obstante, o projeto era muito mais modesto do que aquele que poderia ser empreendido, uma vez que manteve na mão de um grupo restrito a prerrogativa de celebração dos sacramentos, o que findou por produzir uma nova sacerdotalização destas figuras, já que as converte em seres ‘sem os quais não’ há sacramento. O que temos em última instância é uma nova ‘sucessão apostólica’, uma linha contínua de ordenações que legitimam, pelo menos em parte, o exercício do ministério. Tanto barulho pra ficar tudo no mesmo!
O desafio da igreja cristã de nossos dias é retomar a essência da igreja preservada nos textos evangélicos, sem desprezar a condução que o Espírito deu a ela ao longo dos milênios. Para isso importa que quem é veja os irmãos e a si mesmo como se não fosse e quem não é como se fosse. O que proponho é o resgate da tensão produzida por uma honesta e franca visão de si mesmo, conjugada com a submissão humilde à vocação dada por Deus a cada um de nós e manifesta em nossos dons e talentos, para a edificação da casa de Deus sobre a terra. O grande perigo que pesa poderosamente sobre todos nós é o de nos tornarmos o que foram os clérigos nos dias do Messias sobre a terra, o maior obstáculo à propagação do evangelho da graça. Deus tenha piedade de nós.

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@reconciliacao.org

terça-feira, maio 29, 2007

Religiosos: juízes usurpadores do lugar que é exclusivamente de Deus

Uma das passagens mais reveladoras dos evangelhos é aquela registrada nos onze primeiros versículos do capítulo oito do livro escrito por João, sobre a vida e ditos do Salvador. Nela, encontramos Jesus ensinando no templo de Jerusalém, nas primeiras horas da manhã de um novo dia. Neste momento é trazida à sua presença, arrastada por um grupo de escribas e fariseus (eles sempre andam juntos), uma mulher que fora apanhada em flagrante adultério. Ela não tem defesa, nem ninguém se interessa em defendê-la, mas não lhe faltam acusadores. Acusa-lhe a consciência, acusa-lhe o fato ainda no verdor de seu flagror e acusam-lhe os ‘da religião e da fé’.

Quando o assunto é submetido ao crivo do Mestre, este lhe é apresentado acompanhado de uma citação da Lei Mosaica (Deut. 22:22-24), na qual se diz que devem ser mortos por apedrejamento aqueles que neste pecado incorrerem. A tarefa que se espera de Cristo é simples, trata-se de algo que os juristas chamam de subsunção, uma espécie de silogismo lógico, em que se confronta o fato com a previsão legal e se conclui pela sentença a ser dada. O ardil dos religiosos contra Jesus (eu não me lembro de ver religiosos do lado de Jesus, sempre os encontro ‘no contra’), está no fato de que sentenciar alguém à morte seria um descompasso em relação a todo seu ensino, cujos fundamentos eram o amor, o perdão e a comunhão com o Pai.

A primeira reação de Jesus diante do tribunal eclesiástico que se armara diante dele é de desinteresse. É assim até hoje, todas as vezes que em uma igreja (como no templo naquela manhã) os irmãos se reúnem para julgar um outro que foi surpreendido em pecado, Jesus pede licença e vai cuidar da vida dele. Por incrível que pareça, eu não creio que ele abençoe nenhum tipo de juízo eclesiástico, cuja base está da distinção qualitativa ente os juízes e os réus, os primeiros são inocentes os outros, presumidamente, culpados; os primeiros representam Deus, os segundos recebem o castigo (pena) por seus erros, e o recebem por intermédio daqueles. Contudo, o ensino de Jesus é que todos os homens são devedores e incapazes de saldar seus débitos, é por isso que precisam do perdão incondicional de Deus. Não há que se falar aqui sobre quem deve mais ou quem deve menos, porque todos nós devemos mais do que podemos pagar, ou seja, devemos mais do que tudo que temos ou podemos vir a ter.

A parábola do ‘credor sem compaixão’ de Mateus 18:23-35, nos ensina que o desejo do Rei é nos perdoar, mas há em nós esta idéia de que temos que pagar (“sê paciente comigo e te pagarei tudo quanto te devo”, disse o devedor ao rei). Não podemos pagar, nem o Rei precisa receber, mas não suportamos a idéia da graça e sofremos por sermos assim perdoados, sem que se exija de nós nenhum sacrifício, isto porque a nossa natureza reclama por compensações, queremos ressarcir a Deus, mas como poderíamos? O pior é que além de termos tantas dificuldades em receber o perdão e a graça de Deus, somos incapazes de perceber que não temos condições de reclamar dos que nos devem e que a única exigência para que fluamos o pleno perdão é que alcancemos a consciência de que não temos dignidade pra cobrar os débitos dos que conosco convivem.

Voltando para o ‘patético tribunal’, Jesus é chamado para se assentar com os escribas e fariseus na ‘farra da adúltera’, a festa do apedrejamento da pecadora. É aí que, com magistral sabedoria, ele diz: quem for o primeiro vai ser o segundo. As palavras dele foram: “o que entre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra”, mas o significado era o seguinte: quem for o primeiro a apedrejar, abrindo o circo do castigo humano sobre os pecadores, imposto por iguais pecadores, será o segundo a ser apedrejado, porque ‘com a medida com que medires serás medido e com o rigor com que julgares o teu irmão serás julgado’. Foi neste momento que os religiosos viram que não tinham a menor autoridade para serem juízes, que tudo neles havia que os qualificava para serem réus de um desadoro semelhante ao que montaram.

Jesus não impediu o apedrejamento, apenas lhes fez saber que não havia neles competência para julgar, nem honra para jurisdizer. Fazê-lo seria, e é, usurpação dos direitos intransferíveis, inconferíveis e inalienáveis de Cristo. A nós só nos cabe sentar ao lado da adúltera e dizer em uníssono com Cristo: “eu não te condeno, vai e não peques mais”.

Sem juízo,

Martorelli Dantas
martorelli@martorelli.org

segunda-feira, maio 14, 2007

Materna Idade: a universal capacidade de ser mãe

Em seu mais recente CD, intitulado “Cê”, na canção “Homem”, Caetano Veloso diz: “Não tenho inveja da maternidade, nem da lactação”. Será? Não será verdade que todo homem guarda, ainda que dissimuladamente, dentro de si um desejo de ser terra sobre a qual a semente (semen em latim e spermatikon em grego) morra pra renascer planta? Não angustia ao gênero de Adão a esterilidade absoluta de seu ventre, essa completa incapacidade de lançar de si no mundo algo gestado em suas entranhas? Não me qualifico para responder a estas perguntas, posto que nada sei dos anseios alheios, mas reconheço em mim uma veneração quase que religiosa pela sublime potência de ser mãe. Isto sem ignorar que há indelével dor nesta graça.

Ninguém será mãe sem sofrer. E aqui a referência não é à maldição de Gênesis 3:16 (“em meio de dores darás à luz filhos”) – quem dera que o sofrimento materno se limitasse ao desconforto da parturiente – mas tenho em vista o lancinante flagelo de ver o desassossego daquele que até pouco tempo era como órgão em seu próprio corpo e agora chora e clama por um pouco de ar, por uma gota de leite (viço que não é tolo pra correr em masculino corpo), um colo que lhe acolha e aqueça. Que ser dependente é o humano ao nascer! Carece em tudo dos cuidados da mãe. Sai de seu corpo, sem, contudo, poder dele prescindir. Torna-se “alter” (outro), sem se tornar “auto” (independente). E lá vai a mulher... a seguir seu filho por onde quer que vá.

Quando Jesus contou a estória do Filho Pródigo, colocou um pai a deixar seu filho partir para terras distantes, uma vez que jamais uma mãe poderia caber no script do ser frio que divide os haveres; que aceita, sem contestação, a filial petição. Mas quando volta o arrependido, já não é um pai quem o espera, antes, é uma mãe. Porque esse negócio de correr, abraçar comovidamente, restituir honras sem exigir explicações, não corresponde ao pátrio poder, mas ao mátrio sofrer. Se me permitirem a grosseria os irmãos teólogos, é como se o pai que deixa partir fosse o Deus do Antigo Testamento e o que recebe e acolhe fosse Aquele revelado por Jesus e descrito no Novo Testamento. O primeiro lida com os direitos do descendente, o segundo com a graça do recorrente. Conquanto, entenda eu, que nem antes nem depois tivesse o que ‘haver’ (no sentido de receber) quem quer partir.

Mas tenho uma boa notícia para todos os leitores deste nosso humilde periódico: hoje todos podem ser mãe. Não esperem que lhes fale das mais recentes descobertas das ciências, nem de decisões judiciais que permitam a adoção às pessoas que antes se viam impedidas de fazê-lo. Quero lhes falar da ‘Materna Idade’, que vem a ser a universal capacidade de ter filhos. Acredito que todo ser humano chega, ou pode chegar, a uma época em sua vida em que desenvolve a virtude de ‘dar à luz’. Em outras palavras, lhe sobrevém uma maturidade a partir da qual não lhe é mais necessário que todas as coisas convirjam para seu umbigo, como se fosse ele o centro de todo o kósmos (isso é ser criança). Chega um tempo, ou deve chegar, em que alcançamos a grandeza de nos realizar alimentando outros, iluminando (dando luz) os circunstantes, multiplicando nossas vidas através da auto-doação.

Isso não tem a ver com ser homem ou mulher, nem com ser jovem ou adulto. Muito menos está condicionado a ser ou não cristão. A Materna Idade é a busca dos monges budistas e dos yogues indianos, do nirvana à extática experiência (vivência do êxtase). O que estou afirmando é que está impresso no psiquê humano um ciclo que pode e deve ser seguido, no qual nascemos crianças, nos tornamos homens e mulheres e depois viramos mães. As fases deste processo se expressam na decrescente necessidade da umbigalidade (neologismo já conhecido dos irmãos, no qual me refiro a esta compulsão a fazer de si mesmo o epicentro de tudo). É verdade, lamentavelmente, que muitos morrem velhos sem nunca deixar de ser criança.

Nunca ouvi frase mais patética do que esta: “quero ser uma eterna criança”. É como se alguém dissesse: quero depender sempre dos outros; quero ser cuidado e paparicado por toda vida; quero que haja sempre pessoas pra me limpar e limpar as “contribuições” que for deixando pelo mundo. Paciência! Tais quereres precisam ser trocados por outros, tais como: quero que de mim saia sempre vida e nunca morte, quero que do meu peito corra alimento generoso e claro; quero ser todo colo (do latim collum, lugar em que pulsa o coração)... quero ser mãe.

Com maternal carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@reconciliacao.org

Artigo do boletim semanal da Paróquia da Reconciliação do dia 13 de maio, dia das mães.

sexta-feira, abril 27, 2007

Procura-se uma Pessoa para Amar

Procura-se uma pessoa para amar. Deve gostar do mar, uma vez que estamos em Boa Viagem. Deve sentir prazer em abraçar crianças, sobretudo aquelas que não são suas. Deve gostar de andar, de andar muito, de cidade pra cidade, de engenho pra engenho, e fazê-lo com um sorriso no olhar, para que as gentes do caminho não se sintam avaliadas com a sua chegada. Pelo contrário, que os seus passos tragam para o mais simples camponês e para o mais nobre senhor de terras a certeza de que somos todos iguais diante do Criador e de que há dentro de nós esta carência essencial, que é a necessidade de amar e corresponder em amor. Deve gostar de olhar passarinhos e deve querê-los livres, porque querer ver sempre o mesmo passarinho na sua varanda e para isso ali confiná-lo, é ter gosto pelo canto do desconsolo e não pelo louvor da saudação que só os livres sabem dar (“junto aos rios de Babilônia nos sentamos e choramos. Os que nos mantinham cativos nos pediam canções. Como cantaremos os louvores de Israel em terra estranha?” Salmo 137).

Não há necessidade de que seja bonita como as atrizes de Hollywood, nem tem que ter as formas bem definidas dos ‘candidatos a louco’ do Big Brother. Não estamos à procura deste tipo de beleza que passa com a pressa que tem a nuvem e o apogeu da flor. Isso não significa que tal pessoa tenha a faculdade de ser feia. Não há nada mais insuportável do que a feiúra. Feia é toda pessoa que não sabe sorrir ou que o faz de modo plástico e hipócrita. Feia é aquela que não tem paz no coração, cujos pensamentos e sentimentos são sempre um campo de batalha. Que olha pro irmão e não vê nele uma imperdível oportunidade de crescer em amor e compreensão. A feiúra não se disfarça pelo poder da maquiagem, já que quando não se manifesta na face, torna-se inolvidável no toque, particularmente naquele que se faz com as palavras. Desde criança aprendemos que não se deve dizer ‘nome-feio’, o que não nos ensinaram é que todo nome é feio na boca de quem o é.

É indispensável que esta pessoa queira amar todos os dias e não apenas nas noites de lua-cheia. Porque o verdadeiro amor não procura ocasião, não se mantém em potência, deixando de se manifestar por pura pretensão de discrição. O amor que se procura é torrente, é avalanche que se derrama sobre todos, indistintamente. É força vital, é ‘o todo total do tal’ (tal é a letra grega usada como cruz por São Francisco de Assis e que representa o amor simples, pelos simples e pela simplicidade). Não se espera que ame uma vez todos os dias, mas que ame todas as vezes, todos os dias. Que amar seja seu jeito de andar, seu sotaque peculiar, sua forma de partir o pão e de tomar vinho com o irmão. Esse é o amor da criação, quando tudo se fez através do sêmen da palavra, como se a voz tivesse o condão de evocar a existência, ‘ex nihilo’ (do nada), a vida que espera ser chamada. Se os cientistas tivessem lido Gênesis ‘descobririam’ que o caminho para a criação da vida não está na cadeia do DNA, mas nas estruturas das PCA (palavras cheias de amor). Nunca vimos nada realmente novo surgir na terra da Terra que não fosse criado por palavras cheias de amor, e faz muito tempo que é assim.

Contudo, mais do que tudo do que se disse até agora, é necessário que esta pessoa nos ame primeiro, nos ame antes de ser amada, nos ame há muito, mesmo antes de nossa chegada. Procura-se uma pessoa que desde toda a eternidade anda a procura de uma pessoa para amar. Alguém que não tem o capricho dos poetas, que só vêem razão no amor correspondido. Que coisa mais linda há do que o amor que espera, e que enquanto espera se dá, sem nada esperar daqueles a quem tudo dá? É preciso que essa pessoa nos ame primeiro, porque nunca saberíamos amar se amados não fôssemos antes. Porque o amor que se procura é mimetismo do amor divino, é encarnação da graça criadora, é imanência da força redentora e transcendência da fé geradora.

Mas, já que se procura, importa perguntar onde se procurar um amor assim. Recomendamos que se procure em manjedouras, em festas de casamento, na beira do mar e nas estradas empoeiradas dos andantes. Não esqueçam de vasculhar os tribunais, mas nestes, fitem o banco dos réus. É possível encontrá-lo em cadeias, com algemas nas mãos e sangue a tingir seu corpo. Não deixem de olhar para as cruzes erguidas nas estradas, as mesmas estradas nas quais muito se amou. Olhem com atenção os túmulos, mas os vazios. Se, malgrado todo esforço, não encontrarem a pessoa que se procura para amar, vão ao lugar que com certeza a encontrarão, procurem em seus corações, onde aguarda como guarda que não dorme enquanto não quiserem amar.

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@martorelli.org

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Eu quero ser feliz!
Na minha vida pessoal e em minha atividade pastoral, ouvindo todos os dias dezenas de pessoas, conversando sobre suas dores e anseios, a frase que tem sido mais frequentemente repetida é esta: eu quero ser feliz! Parece-me que elas, por alguma razão, foram tomadas pela urgência de se fazerem felizes. De verem suas carências e expectativas atendidas o mais rápido possível. Sentem que a vida está passando em sua marcha irrefreável e não podem mais “perder tempo”.

E o que é “perder tempo”? É postergar (deixar pra depois) a satisfação, a realização de suas fantasias e desejos mais íntimos. Já passou tempo demais, urge quebrar os paradigmas, abrir as gavetas da imaginação à procura do desconhecido e exótico, que é, ao mesmo tempo, intensamente cativante e inebriante. Não importa que as pessoas sofram, que projetos longamente trabalhados venham a ruir em um passe de mágica (magia negra), que os valores mais caros tenham que ser esquecidos ou momentaneamente suspensos. É preciso ser feliz, e agora!

Ocorre que, frequentemente, estas pessoas continuam infelizes depois de fazerem o que “lhes deu na telha”. Colocaram a si mesmas e às figuras mais caras ao seu redor sob risco, ou mesmo, as magoaram profundamente e neste momento, com algum constrangimento, perguntam: é só isso? Foi por isso que eu deixei tudo? É nesta hora que elas chegam ao gabinete para conversarmos e orarmos juntos. Quando o “vidro foi quebrado”, quando a palavra foi dita, quando a cama foi desfeita, quando o copo chegou ao fim. Quanta frustração nos olhos e pesar na alma. “Mas é preciso ter coragem pra recomeçar...”.

Estou convencido que o maior mal deste novo século, não é, como ocorreu no século XX, a depressão e a ansiedade, mas a egolatria (culto ou adoração ao ego). Por uma série de razões que não poderei expor aqui, o ser humano do século XXI tornou-se egocêntrico e imediatista. Cada vez mais os seus sonhos foram se voltando para eles mesmos, para os seus corpos nos limites mais estreitos.

Os humanos são seres gregários, como formigas e abelhas, lhes é necessário viver em comunidade. Eles precisam de seres semelhantes a eles constantemente próximos para que alcancem (ou mantenham) sua identidade, uma sanidade física e emocional. Contudo, para que assim aconteça, mister se faz que eles se ajudem mutuamente, se toquem, se estimulem... se amem. Além disso, são seres morais e espirituais, carecem de valores capazes de dar sentido e direção à travessia em que consiste sua existência; de um relacionamento que transcenda sua umbigalidade (vida centrada no próprio umbigo).

Não é por outra razão que Jesus apontou o caminho para a vida eterna (que aqui deve ser entendida como uma vida cheia de razão, contentamento e paz), ensinando: “amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força. E amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que estes” (Mc. 12: 30 e 31). Queria, o grande Mestre, nos mostrar que a verdadeira felicidade só é alcançada se estendermos as fronteiras de nossos projetos de tal modo que se tornem capazes de albergar aqueles que estão ao nosso redor. A minha felicidade está única e exclusivamente na possibilidade de ver pessoas felizes perto de mim, em fazê-las felizes.

Nesta mesma esteira, São Paulo disse que o corpo da mulher não pertence a ela, e sim ao seu marido; e que o corpo do marido não pertence a ele, mas à sua esposa (1º Cor. 7:4). Logo, a responsabilidade pela satisfação e alegria de seus corpos teve a titularidade transferida. Casar é, portanto, um ato de irremediável entrega, doação. Confiar a si mesmo nas mãos de um outro ser exclusivamente por amor e em amando ser feliz. Lembra Chico dizendo: “se ao te conhecer fiz tantos desvarios, rompi com o mundo, queimei meus navios, me diz agora como é que eu posso ir?”.

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@reconciliacao.org

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Livres do Desânimo (ou de como estou velho, mas não estou acabado)

Hoje, eu fiz 39 anos e pela primeira vez ouvi, com certa ironia, a tradicional canção “Parabéns pra você”. Fiquei pensando no porquê das pessoas estarem me felicitando, se o que meu aniversário indica é que eu estou me acabando, que a minha vida está chegando ao fim, que, de modo inexorável, a minha morte galopa lépida em minha direção? Senti bater em mim, quase de modo inédito, o sentimento tão conhecido dos poetas e cantores, esta angústia de me saber finito.

Lembrei-me de Vinícius, dizendo que, no final das contas, tudo se resume nisso: “...por cima uma laje, por baixo a escuridão. É fogo irmão, é fogo irmão!”. Recordei-me de que uma vez ele disse: “Resta esse diálogo cotidiano com a morte, esse fascínio pelo momento a vir, quando, emocionada ela (a morte) virá me abrir a porta como uma velha amante, sem saber que é a minha mais nova namorada”. E como esquecer de Gil, cantando que "se eu quiser falar com Deus, tenho que dizer adeus, dar as costas, caminhar, decidido, pela estrada que, ao findar, vai dar em nada, nada, nada ... do que eu pensava encontrar”. E para que os mais jovens não digam que só a rapaziada “das antigas” tinha tais pensamentos, cito meu querido Paulinho Moska, perguntando: “Então me diz qual é a graça de já saber o fim da estrada, quando se parte rumo ao nada?”.

A minha alma foi tomada por assalto e quase permiti que a tristeza a invadisse subitamente. Foi quando me ocorreu o texto de Paulo, registrado na 2ª carta aos Coríntios, no capítulo 4, versículos de 16 a 18, onde se lê: “Por isso, não desanimamos; pelo contrário, mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, contudo, o nosso homem interior se renova de dia em dia. Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação, não atentando nós nas coisas que se vêem, mas nas que se não vêem; porque as que se vêem são temporais, e as que se não vêem são eternas”.

Não há motivos para eu me deixar desanimar (palavra que vem do latim e significa perder o espírito, esvaziar-se do fôlego da vida), e o Apóstolo explica o porquê. Ainda que o meu “homem exterior”, o meu corpo e mesmo as posses que tenho se desfaçam com o tempo, há algo em mim que não envelhece nem caduca jamais, o meu “homem interior”, o meu espírito, o meu relacionamento com o Deus Vivo e Verdadeiro. Nele, eu posso mais hoje do que podia quando tinha 17 anos. Como disse Jesus, nem a traça, nem a ferrugem, nem o ladrão (tudo isso que é o tempo) podem fazer com que eu perca o meu tesouro que está nos céus.

Lá, vale a pena investir, até porque, assim fazendo, podemos andar seguros na Terra. Não como o arrogante milionário, que coloca sua confiança naquilo que um ato governamental ou uma repentina variação de mercado podem destruir de uma hora pra outra, mas vestidos da paz, filha da certeza de sermos herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo das riquezas do Pai. Quem sabe disso rouba da morte o seu aguilhão (1º Cor. 15:55), livra-se do pavor da contínua decomposição dos seres e pacifica a alma diante das incertezas do futuro.

Uma das idéias que mais me impressiona na passagem de 2ª Coríntios é aquilo que Paulo chama de “leve e momentânea tribulação”. O que seria isso? A resposta está alguns capítulos depois, quando ele descreve as coisas que vinha passando por causa do Evangelho: suas prisões, seus naufrágios, os açoites dos quais foi vítima, as traições que sofreu, a fome e a nudez. Isso era a sua “leve e momentânea tribulação”. Como é possível? Deixem que ele próprio responda: tudo isso é pequeno e irrelevante quando contrastado com a eterna glória que já começa a ser derramada sobre nós, a ponto de já sentirmos o seu peso. Imagino como os tradutores da Bíblia devem se encontrar em maus lençóis para traduzirem a expressão grega utilizada pelo autor, hiperbolê eis hipérbolê, ou seja, um exagero que leva a outro exagero, algo sem qualquer comparação. A nossa dor é tão pouca, quando comparada a um prêmio tão grande; os nossos dissabores são tão pequenos, quando os pomos em frente a tudo quanto Deus nos tem dado e ainda nos dará!

Por fim, o nosso amigo nos ensina que se quisermos ser, de fato, felizes, precisamos aprender a ver o invisível. Parece que Antoine de Saint-Exupéry, ao escrever o Pequeno Príncipe, tinha em mente este texto de Paulo, e disse que “o essencial é invisível aos olhos”, mas esqueceu de dizer que é preciso que tenhamos olhos para ver o essencial, ver o invisível. Há somente um olhar capaz disso, o olhar da fé. Aquele que fez com que Moisés, “pela fé, abandonasse o Egito, não ficando amedrontado com a cólera do rei; antes, permanecesse firme como quem vê Aquele que é invisível” (Heb. 11:27).

Não quero ser eternamente jovem, quero ser eternamente feliz!

Com carinho,

Martorelli Dantas

terça-feira, janeiro 09, 2007

Vivendo Acima da Mediocridade

Estamos vivendo os primeiros dias de 2007, isto por si só é um fato extraordinário. Deus nos deu não apenas um novo dia, mas um ano novo para vivermos. De algum modo chegamos até aqui. Quando era criança costumava pensar em como seriam o mundo e a minha vida no longínquo e mítico ano 2000. Este ano chegou e a vida neste tempo é de fato extraordinária. Só nos filmes de ficção científica poderíamos pensar em coisas como telefone celular, computadores, cirurgias realizadas por videolaparoscopia, ou seja, sem que haja necessidade de produzir uma grande incisão no corpo do paciente. E o que falar do avanço das cirurgias estéticas, que permitem que as pessoas, que tenham recursos para custeá-las, possam ter praticamente a aparência que quiserem ter?
Dos dias de minha infância até hoje, muita coisa mudou. Lula, o líder sindical da CUT, é presidente da república e o PT, o partido dos estudantes revolucionários, está no poder. Somente nos sonhos mais alucinados alguém que viveu o início da década de 80 poderia imaginar isso. Mas, paradoxalmente, muitas realidades continuam as mesmas. Os seres humanos continuam agredindo o meio-ambiente; ainda mentem para encobrir seus erros e fraquezas; suas relações interpessoais ainda são marcadas pelo egoísmo e pela superficialidade e continuam levando vidas medíocres. Se me perguntassem qual a maior enfermidade que destrói a nossa geração, eu não diria que é o câncer, a AIDS ou enfermidades ligadas ao sistema cardiovascular. Creio que o maior mal é a assunção da mediocridade com algo normal e perfeitamente aceitável. Onde está o desejo de fazer de nossas vidas algo realmente maravilhoso? Onde está “a renúncia à poesia não vivida”?
A mediocridade é um fenômeno tão poderoso que é mesmo difícil discernir o quanto as nossas vidas foram dominadas por ela. Esta é a razão porque lhes proponho um esforço de diagnóstico para que busquemos uma compreensão de sua presença na vida que estamos levando. Em primeiro lugar, vamos ver se passamos a maior parte do tempo vivendo ou fantasiando. Se estamos tentando fugir de nossa realidade através de ilusões auto-produzidas, auto-induzidas, ou se de fato estamos tão interessados no que temos experimentado no dia-a-dia que não temos interesse nisso. É impressionante como as vidas se tornaram desinteressantes e as pessoas partiram para os diferentes tipos de virtualidade. E o que há de sedutor nestas vidas de mentira? A possibilidade de não ser você mesmo, e isto é tudo que muitas pessoas desejam. Não ter os filhos que têm, não estar casado(a) com quem está, não passar a maior parte do dia fazendo o que faz... assim constroem uma “segunda vida” em lugar de transformar a que têm.
Um segundo passo para averiguarmos se a mediocridade se instalou ou não em nós é o nível de emoção/vibração de nossas atividades, quer sejam profissionais, amorosas ou ministeriais. Parece que a maioria das pessoas acredita de fato que o tédio é o caminho inexorável da existência humana, que mais cedo ou mais tarde a monotonia vai nos fazer sucumbir. O pior é que muitos, ansiando as emoções que não têm, caem no erro de viver uma vida dupla, de levar uma “vida escondida”, e a emoção está em não permitir que ela seja revelada. Tem coisa mais medíocre do que não ter coragem de assumir suas escolhas, que não expor suas idéias e sentimentos? Creio que temos a oportunidade de viver uma vida extraordinariamente emocionante baseada na fé, na capacidade de aceitar desafios não fundamentados meramente na racionalidade, mas na direção dada por Deus e provada pela oração e pelo jejum. Seguir o sopro do Vento de Deus.
Por fim, temos o mais nosso de todos os sintomas de mediocridade. O cinismo com que tratamos o modelo de vida proposto por Jesus. Em passagens como o Sermão da Montanha ele nos ensinou sobre como devemos lidar com os nossos inimigos, como reprimir nossos desejos pecaminosos e como ordenar as nossas prioridades de tal modo que os valores do Reino de Deus sejam o maior de todos os tesouros em nossas vidas. Contudo, a quase totalidade dos cristãos que eu conheço (inclusive eu) faz questão de ignorar tudo isso e se pautam por padrões de conduta que vigoram na sociedade ao redor de nós. Continuamos chamando Jesus de Senhor e Mestre, mas seguimos os passos dos seres “bem-sucedidos” que nos impressionam mais pelo que têm do que pelo que são.
Este ano é a nossa oportunidade para deixarmos de ser medíocres. Vamos ver se começa por mim.
Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@reconciliacao.org

quinta-feira, janeiro 04, 2007

Uma Oração de Saudade e Pedido de Força [*]

Jesus nos ensinou que é melhor a casa de luto do que a casa de festa, pois na casa de luto se discerne os corações dos homens. Hoje os nossos corações são saudade e melancolia. A partida não de um ente querido, mas do mais querido de todos os entes é pura consternação, por esta razão importa buscar a Tua graça consoladora, oh amantíssimo Deus. Clamamos que derrames sobre nós do teu Espírito Santo para que possamos não apenas suportar a dor desta separação, mas também para fortalecer dentro de nós a convicção de sua temporalidade, e de que em breve a poderosa mão da Providência nos reaproximará em um venturoso encontro de alegria e paz.

Agora, quando celebramos a memória de nossa mãe, quando elevamos a Ti nossas orações e preces em seu favor e em louvor por sua indelével memória, pedimos mais por nós do que por ela. Isto porque sabemos que agora ela é toda consolação e conforto, enquanto nós jazemos na Terra sem o lugar em que nos sentíamos mais aconchegados e protegidos, o seu colo de amor. Viver é como navegar, é preciso, contudo, que nunca nos esqueçamos das lições aprendidas, dos exemplos vistos, da caridade revelada em gestos de entrega e compromisso. Que esta nossa tristeza seja ungida com as gotas do óleo da esperança e que em nossa pequenez e fraqueza se manifestem mais amplamente o Teu poder e fidelidade.

O evangelista João nos conta que quando o Salvador viu o cenário de dor que cercava o túmulo de seu amigo Lázaro não pode conter as lágrimas e chorou. Pranteou não pelo que havia partido, mas por todos aqueles que estavam em seu entorno e que não compreendiam a dinâmica da morte e da vida. Chorou por Marta e Maria, por seus parentes e afins, que se sentiam desguarnecidos pelo afastamento do de cujos. Chorai também por nós neste dia, oh Senhor! E ensina-nos as lições da paciência e da fé para que aguardemos a tua chegada e a concretização de Tuas inolvidáveis promessas. Saber nunca deu conta do viver, por isso faze-nos crer e aguardar em tranqüila expectativa a ocorrência de nosso eterno e amoroso abraço. Senhor tem piedade de nós! Amém!

[*] Escrito para meu amigo Fernando Viana por ocasião da Missa de Sétimo Dia de sua querida mãe.
A Hora e o Lugar da Virada

Sempre que o final do ano se aproxima surge na maioria de nós este sentimento de que algo novo vai começar, como se a vida estivesse nos dando “mais uma chance” de sermos felizes. Nos pomos a tecer sonhos sobre como será a nossa vida no ano novo, que mudanças radicais vamos realizar. Pensamos em tudo aquilo que vamos, finalmente, fazer e que definirá novas diretrizes para o curso de nossa história. É um clima de otimismo e de esperança realmente contagiante.
Infelizmente toda esta positividade, via de regra, não chega sequer a superar o carnaval. Mal passa a festa de Momo e já nos flagramos decepcionados com o curso que tomou as nossas vidas. Mais parece um carma, um castigo, uma sina; como se estivéssemos condenados pelo destino a cometer os mesmo erros, termos os mesmos sentimentos e colhermos as mesmas conseqüências. Será que nada, senão o próximo ano, pode conter estes acontecimentos?

Em primeiro lugar, precisamos entender que todos os dias começamos um ano novo. A distância entre o dia 18 de fevereiro e o próximo dia 18 de fevereiro é de um ano, logo no dia 19 sempre começa um ano novo. É assim em todos os dias do ano. Sempre podemos recomeçar, mas o desafio não é “começar de novo”, é “começar de modo novo”. Em segundo lugar, para haver de fato novidades em nossas vidas é preciso que haja uma agenda nova de pensamentos, sentimentos, falas, atos e hábitos. E tais mudanças devem ser orientadas por valores mais elevados que aqueles que temos cultivado até hoje.

Pouco importa se o ano é novo se a vida é velha. Se os nossos valores, a nossa postura, se a forma como vemos as pessoas e as circunstâncias nas quais nos encontramos é a mesma, não temos o direito de esperar resultados diferentes dos que obtivemos no passado. A primeira e a mais importante libertação é aquela que acontece em nosso interior. A primeira e a mais importante transformação é aquela que ocorre dentro de nós.

Por isso Jesus não lutou contra Roma, mas contra o Diabo; por isso ele não se digladiou contra César, mas contra o espírito do materialismo e do fundamentalismo de seus dias; por isso ele se fez amigo de pecadores e inimigo de religiosos, e convidou a ambos para o arrependimento e à conversão. Cristo abalou o mundo não com generais e exércitos, mas através da força de pescadores e camponeses. No Nazareno os fracos são fortes, a força dos homens nada pode, e hoje é sempre o dia do milagre.

Quero convidar você a fazer do dia 31 de dezembro, o momento da virada na sua vida. Não porque é ano novo, mas porque você precisa de uma vida nova. Para isso aconselho que façamos duas coisas: apresentemos a Deus em oração os nossos desejos de novos resultados em nossas vidas e busquemos a atitude que nos levará a tais objetivos. Um dia ouvi de um amigo uma frase que jamais poderei esquecer: reflita sobre os hábitos que podem lhe levar às suas metas e torne-se escravo deles. Vamos fazer isso. Feliz vida nova.

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@martorelli.org