quarta-feira, junho 18, 2008

As Fogueiras de São Pedro

Alguns elementos quase que desapareceram completamente dos festivos juninos, outros rarearam de tal modo que com muita dificuldade os vemos em nossos dias. Por motivos de segurança, desapareceram os belíssimos balões que enchiam de leveza e sedução os céus de minha infância; as residências com pequenas bandeirolas decorando-as e as ruas transformadas em arraiais dos folguedos matutos são praticamente impossíveis de ver com a naturalidade com a que eram encontradas anos atrás; as fogueiras que na década de 70 estavam presentes na frente de cada residência, hoje são encontradas apenas nas fachadas dos mais tradicionais, até porque muitos de nós moramos em apartamentos que ou inviabilizam ou esvaziam de sentido tudo isso.

Para os saudosistas como eu, já não existe a Festa de São João, pois já não há quadrilhas que não sejam dedicadas exclusivamente para dançarinos profissionais, não se encontram mais espaços onde seres “desuingados” como o autor deste texto, possa se alegrar e sorrir com seus pares na levada dos balancês e alavantus. Lembro como muitas vezes eu chegava em casa, depois de ir de arraial em arraial durante toda madrugada, por volta das 5h da manhã e passava pelos restos das fogueiras que tinham ardido durante toda a noite. Elas haviam passado pelas várias fases, a beleza da incandescência inicial, com labaredas altas e violentas, depois aquele ardor contínuo e leve, até chegar aos estertores, às cinzas ainda reluzentes, o melhor momento para assar um milho verde. Mas há fogueiras que não se apagam nunca. Que foram acesas há dois mil anos e continuam como na primeira noite.

Nos Evangelhos existem duas e apenas duas fogueiras, ambas relacionadas à pessoa de São Pedro. A primeira foi acesa no pátio exterior da casa de Anás, sogro do sumo-sacerdote Caifás, para onde Jesus foi levado depois de ter sido preso no jardim do Getsêmani (Lc. 22:55). Ali, assentou-se Pedro, tentando passar desapercebido no meio dos curiosos que se aglomeravam naquele local para saber qual seria o destino do Rabino Galileu. Foi nesta geografia que se realizou a tríplice negativa do apóstolo, afirmando em meio a juras e impropérios que não conhecia o Encarcerado. Esta é a fogueira da queda, da vergonha, da negação, do desrespeito. Nela os ideais e os compromissos de amor foram queimados, lançados ao fogo pela covardia associada à fraqueza. O resultado desta combustão terrível é a amargura de alma, foi assim que o pescador deixou aquele local e assim deve ter permanecido muitos dias, mormente porque em seguida Jesus foi julgado, crucificado e morto... e Pedro não estava lá.

Graças a Deus há outra fogueira. Esta não foi acesa pela curiosidade, pela necessidade ou pelo medo, mas por amor. Refiro-me àquela que foi acesa por Jesus, já ressurreto na praia do Mar da Galiléia (Jo. 21:9), lugar onde três anos antes ele havia travado os primeiros contatos tanto com Pedro, quanto com André e João. Os discípulos tinham voltado à antiga prática da pescaria, eles costumavam fazer isso durante a madrugada com o objetivo de atrair os peixes com a claridade de suas lamparinas, mas naquela noite, mais uma vez, eles não tinham tido sucesso, estavam terminando o trabalho daquela noite sem terem colhido nenhum resultado. Quando se aproximaram da margem, ouviram uma voz de homem que lhes perguntava se tinham apanhado alguma coisa e eles responderam que não. Foi então que este homem lhes disse: “joguem do lado direito suas redes!”. Fizeram isso e pescaram muitíssimos peixes. Aquela frase e aquele resultado levaram a João a recordar, a ter uma sensação de deja vu, e se deu conta que este homem era Jesus.

Eles puxaram os barcos para a praia e encontraram Jesus assentado em um canto, com a fogueira acesa e com alguns peixes assando, bem como pão para uma refeição matinal que teriam ali. Esta é a fogueira da restauração, ela não é apenas acesa por Jesus, os pães e peixes também são dele, ele tudo provê. Foi ali bem perto que o Salvador perguntou a Pedro: “tu me amas?” E ouviu por três vezes a mesma resposta do pescador: “Eu te amo”, ao que lhe disse Jesus: “apascenta as minhas ovelhas”. Sobre cada negação Cristo sobrepôs uma oportunidade de reafirmação da fé e do compromisso. Para cada ato de renovação, Jesus ofereceu uma corroboração da mesma antiga vocação de amor e serviço ao próximo.

Amigo, irmã... pode ser que você esteja vivendo a tristeza e a amargura da queda, ao redor da fogueira do desencontro, mas fique sabendo que seja lá o que você tenha feito, dito ou deixado de fazer, há uma outra fogueira para onde você pode ir. É lá que Jesus está lhe esperando para comer com você um sanduíche de peixe e te oferecer perdão e verdadeira paz, por falar nisso... Paz e Bem!

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@martorelli.org

quinta-feira, junho 05, 2008

Eu acredito em dragões!

Esta vida é engraçada. Existem lendas em que quase todos crêem e verdades nas quais quase ninguém acredita. Este é o caso dos dragões, aqueles seres com os quais estamos tão familiarizados desde crianças, que fazem parte das estórias que lemos, ouvimos e vimos em filmes e desenhos animados. De tanto vê-los assim, “mitificados”, somos induzidos a pensar que eles não existem, mas eles são bem reais. Eu mesmo já vi muitos dragões, e daqueles de cujas bocas saem fogo que consome suas vítimas.

Há uma ilha na Indonésia chamada Komodo. Lá encontramos dezenas de dragões, eles são chamados de dragões de Komodo, podem chegar a ter 3,5 m de comprimento e pesar 125 Kg. São enormes. Parecem-se com lagartos gigantes, mas se deslocam com lentidão. Sua arma letal é a boca inflamada. Assim como os tubarões, os dragões de Komodo têm fileiras de dentes, onde ficam depositados os restos de suas refeições e ali elas apodrecem, produzindo diferentes e potentes tipos de bactérias. Ao atacar suas vítimas, geralmente de emboscada ou aproximando-se delas silenciosamente, basta-lhes dar uma abocanhada e em seguida soltá-las. As bactérias farão o resto do trabalho. Seguem as vítimas de longe, vendo-as serem paulatinamente consumidas pelos pequenos monstros que eles nelas introduzem mordendo-as.

Sim, mas eles soltam fogo pela boca? Claro! Você já teve uma infecção violenta? Se teve, sabe que a sensação é que se está pegando fogo. Um calor que partindo do ferimento vai se espalhando por todo corpo e isso vai consumindo o enfermo. Se ele não for socorrido logo pode vir a óbito em poucas horas. É o caso das refeições do lagarto em tela. São Tiago diz que é comum haver também dragões humanos, mas neste caso o veneno, as mortíferas bactérias, não estão depositadas em seus dentes, mas nos órgãos da fala. Ele diz: “a língua é fogo; é mundo de iniqüidade; a língua está situada entre os membros de nosso corpo, e contamina o corpo inteiro e não só põe em chamas toda a carreira da existência humana, como é posta ela mesma em chamas pelo inferno” Tg. 3:6.

Estamos diante de uma realidade terrível, poucas pessoas têm sido vítimas em nossos dias dos dragões pesados e desajeitados de Komodo, mas em toda parte, na família, nos negócios, nas relações fraternas... abundam os que cambaleiam tocados por línguas ferinas que, nas palavras do escritor sacro, estão a serviço do diabo e do inferno. Mas como elas fazem isso? Há basicamente três formas de envenenamento: a mentira, a provocação e o lançamento de dúvidas. Muitas vezes estes venenos são administrados conjuntamente e acabam produzindo mais celeremente seus efeitos. Analisemos brevemente cada um deles.

A mentira sobre a qual estamos falando não é aquela que é animada pela covardia de quem não quer assumir a responsabilidade de suas escolhas e de seus erros. Referimo-nos à mentira que é a distorção de fatos com o objetivo de prejudicar uma pessoa. Mente quem inventa tais narrativas e quem as repassa sem que tenham sido verificadas, isto porque estes últimos são úteis ao propósito de destruir àqueles sobre quem se fala. Pergunte-se apenas uma coisa: se algo ruim está sendo dito sobre alguém, por que eu tenho que participar disso? Por que eu devo dar a minha contribuição para elamear a vida e a história de uma pessoa? Caso o que se diz seja verdade, ela não precisará de minha ajuda para se firmar. Caso não seja verdade, não é bom nos manchemos com o sangue de um inocente.

O segundo tipo de veneno a que nos dispomos a pensar é a provocação. Isto ocorre quando uma pessoa se permite instrumentalizar para lançar discórdia entre dois irmãos. Instiga um contra o outro, faz aquele papel de menino safado que fica dizendo: “carinha da mãe de um, carinha da mãe do outro”, para que crianças abobalhadas ferindo o objeto que representa a mãe do então adversário se envolvam numa briga, enquanto o que a provocou ri de ambos. Este é sem dúvida um agente do diabo. O livro de Provérbios diz que se há algo que Deus abomina é quem lança discórdia entre irmãos (Pv. 6:16-19) e Jesus nos ensinou que são bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus (Mt. 5:9). O que você é?

O último veneno a ser comentado é o que se presta a lançar dúvidas. Não se trata de mentira, porque a sagacidade do agente não o faz fazer afirmações. Nem se trata de provocação, porque necessariamente a dúvida não é lançada para criar contendas entre duas ou mais pessoas. Há pessoas que são realmente mestras em tirar a paz e a segurança dos outros, uma vez que o que nos aquieta a alma é a possibilidade de ancorá-la em alguma certeza. Em Otelo, o dramaturgo inglês Shakespeare, com refinamento incomparável cria o “inferno da dúvida”. Posto que a dúvida não nos tira apenas a determinação no agir, mas retira a tranqüilidade em decidir, seja lá qual for a decisão.

Quer um conselho? Afaste-se de dragões, sejam eles quais forem. Escute esta exortação: se você é dragão se converta!

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@martorelli.org