quinta-feira, junho 14, 2012

A Ética da Esperança

Por Martorelli Dantas

Muitos supõem que a esperança é uma realidade exclusivamente interior, que ela é algo que o indivíduo carrega consigo e que serve para animá-lo a aguardar com positividade algo que almeja que aconteça. Contudo, eu creio que há um aspecto extremamente importante da esperança que tem sido negligenciado, tanto no ensino cristão hodierno, quanto em nossas conversas informais. Refiro-me à ética da esperança. Por ética eu tenho um modelo ou padrão de conduta, algo que é ditado por convicções profundas e valores que norteiam nossas relações e comportamentos concretos. Devemos afastar os conceitos de ética e moral. Enquanto a moral encontra os seus parâmetros nos dogmas comportamentais, ditados pela tradição ou pelas leis religiosas e sociais, a ética é fruto de uma racionalização do modo de viver e visa a construção de um “bem-estar intersubjetivo”.

Mas o que seria esta ética da esperança? Penso que se acreditamos sinceramente que algo vai acontecer, devemos ter um comportamento e uma linguagem condizentes com esta esperança. Caso contrário acontece conosco como naquela estória, em que uma mulher leu na Bíblia a frase de Jesus: “se tiveres fé como uma semente de mostarda, direis a ente monte passa daqui para ali e ele passará”. Pensou ela consigo mesma: vou ver se isso dá certo... ordeno a você monte, que fica na frente da minha casa e que me impede de seguir pelo caminho mais curto até a feira, saia daí e vá 500m para a esquerda! Disse isso e foi dormir. No dia seguinte quando abriu a janela, lá estava o monte no mesmo lugar, ao que concluiu: eu sabia que isso num ia dar certo. O que ela sempre soube que seria, nisso é que ela cria! E foi isso que ditou a conduta e o coração dessa senhorinha.

Quem tem esperança deve levar uma vida de quem tem esperança. Se não for assim, o que essa pessoa tem são palavras de esperança, que, como no caso das palavras de amor, são realidades essencialmente diferentes. O Mestre nos ensinou com insistência para que não prestemos muita atenção em palavras: “nem todo que dize Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus”; “aquele que ouve estas minhas palavras e as pratica...”; “o primeiro filho disse: eu vou, mas não foi. O segundo disse: eu não vou, mas depois arrependido foi”. Em todas estas passagens a ênfase de Jesus é para a insignificâncias das palavras, quando elas estão desconectadas de atitudes consistentes com a declaração. Discurso sem vida é confusão, não é confissão, muitos menos profissão.

Acho lindo meu irmão Paulo nos contar que Abraão “esperou contra a esperança” (Rom. 4:18). Entendo que o que ele está dizendo é que quando as circunstâncias já não podiam sustentar a esperança; quando não havia nada de palpável em que a esperança se escorasse; nada para dar à esperança alento e sobrevida; no momento em que a promessa caiu no evidente absurdo, ele continuou crendo. Seu comportamento foi o de quem persevera em esperar nas palavras daquele é fiel. A cada raiar do sol ele se levantava imaginando que poderia ser aquele o dia em que seu corpo se enternuraria pelo de Sara, em que o sopro do Espírito o entumeceria como dantes. A cada por do sol, ao deitar-se no colo de sua esposa, sempre bela e amada, supunha que seria naquela noite em que a mão do Todo Poderoso desenlaçaria seu ventre para dar curso a uma semente de vida.

Continuar procurando Sara é um exemplo de ética da esperança, se ao fazê-lo Abraão tinha em seu íntimo a certeza de a estar engravidando. Ética da esperança é não devolver mal por mal como expressão da confiança de que só o Senhor é o único legítimo juiz e só ele tem o direito de “retribuir” em seu favor, quando e se achar que deve. Enquanto isso você segue a senda da misericórdia, da compreensão e do perdão. Não creio que haja fundamento para falar de fé sem que ela esteja associada à ética da esperança. Talvez seja isso que Tiago quis referir quando disse que “a fé sem obras é morta”. O meu convite para você é que repense seu modo de falar e de agir, perguntando a si mesmo se este comportamento é adequado em relação às convicções que aninha em sua alma. Se não for assim, há um só caminho, converta-se!