Eu quero ser feliz!
Na minha vida pessoal e em minha atividade pastoral, ouvindo todos os dias dezenas de pessoas, conversando sobre suas dores e anseios, a frase que tem sido mais frequentemente repetida é esta: eu quero ser feliz! Parece-me que elas, por alguma razão, foram tomadas pela urgência de se fazerem felizes. De verem suas carências e expectativas atendidas o mais rápido possível. Sentem que a vida está passando em sua marcha irrefreável e não podem mais “perder tempo”.
E o que é “perder tempo”? É postergar (deixar pra depois) a satisfação, a realização de suas fantasias e desejos mais íntimos. Já passou tempo demais, urge quebrar os paradigmas, abrir as gavetas da imaginação à procura do desconhecido e exótico, que é, ao mesmo tempo, intensamente cativante e inebriante. Não importa que as pessoas sofram, que projetos longamente trabalhados venham a ruir em um passe de mágica (magia negra), que os valores mais caros tenham que ser esquecidos ou momentaneamente suspensos. É preciso ser feliz, e agora!
Ocorre que, frequentemente, estas pessoas continuam infelizes depois de fazerem o que “lhes deu na telha”. Colocaram a si mesmas e às figuras mais caras ao seu redor sob risco, ou mesmo, as magoaram profundamente e neste momento, com algum constrangimento, perguntam: é só isso? Foi por isso que eu deixei tudo? É nesta hora que elas chegam ao gabinete para conversarmos e orarmos juntos. Quando o “vidro foi quebrado”, quando a palavra foi dita, quando a cama foi desfeita, quando o copo chegou ao fim. Quanta frustração nos olhos e pesar na alma. “Mas é preciso ter coragem pra recomeçar...”.
Estou convencido que o maior mal deste novo século, não é, como ocorreu no século XX, a depressão e a ansiedade, mas a egolatria (culto ou adoração ao ego). Por uma série de razões que não poderei expor aqui, o ser humano do século XXI tornou-se egocêntrico e imediatista. Cada vez mais os seus sonhos foram se voltando para eles mesmos, para os seus corpos nos limites mais estreitos.
Os humanos são seres gregários, como formigas e abelhas, lhes é necessário viver em comunidade. Eles precisam de seres semelhantes a eles constantemente próximos para que alcancem (ou mantenham) sua identidade, uma sanidade física e emocional. Contudo, para que assim aconteça, mister se faz que eles se ajudem mutuamente, se toquem, se estimulem... se amem. Além disso, são seres morais e espirituais, carecem de valores capazes de dar sentido e direção à travessia em que consiste sua existência; de um relacionamento que transcenda sua umbigalidade (vida centrada no próprio umbigo).
Não é por outra razão que Jesus apontou o caminho para a vida eterna (que aqui deve ser entendida como uma vida cheia de razão, contentamento e paz), ensinando: “amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força. E amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que estes” (Mc. 12: 30 e 31). Queria, o grande Mestre, nos mostrar que a verdadeira felicidade só é alcançada se estendermos as fronteiras de nossos projetos de tal modo que se tornem capazes de albergar aqueles que estão ao nosso redor. A minha felicidade está única e exclusivamente na possibilidade de ver pessoas felizes perto de mim, em fazê-las felizes.
Nesta mesma esteira, São Paulo disse que o corpo da mulher não pertence a ela, e sim ao seu marido; e que o corpo do marido não pertence a ele, mas à sua esposa (1º Cor. 7:4). Logo, a responsabilidade pela satisfação e alegria de seus corpos teve a titularidade transferida. Casar é, portanto, um ato de irremediável entrega, doação. Confiar a si mesmo nas mãos de um outro ser exclusivamente por amor e em amando ser feliz. Lembra Chico dizendo: “se ao te conhecer fiz tantos desvarios, rompi com o mundo, queimei meus navios, me diz agora como é que eu posso ir?”.