quarta-feira, março 05, 2008

Um coração de mulher

Ontem celebramos o Dia Internacional da Mulher, a própria existência de uma comemoração assim já nos revela o fato de que ainda há muita discriminação em nosso meio. Não fosse isso verdade seria desnecessária tal festividade. Quem já ouviu falar do Dia Internacional do Homem? Homens e mulheres são realmente muito diferentes. Não apenas física e emocionalmente, mas também no que diz respeito às práticas espirituais. Desde que comecei o meu ministério pastoral, há vinte anos, foram sempre as mulheres que vi sustentando as igrejas, através de seu trabalho, dedicação, compreensão e amor. Nos cultos de oração das mais humildes congregações, lá estão elas aos pés do Senhor, clamando por seus esposos, por seus filhos... por seus líderes. As mulheres são o esteio da igreja.
Na Bíblia esta realidade também se revela. São inúmeras as mulheres em ambos os Testamentos que enaltecem o gênero pelo seu modo digno de viver e de agir. Mais que submissas, elas são verdadeiras auxiliadoras de seus maridos, quando não seu arrimo e consolação. Mulheres santas como Sara, esposa de Abraão; Ana, mãe de Samuel; Rute, companheira de Boaz. Marcadas pela profunda confiança em Deus e por uma completa devoção às suas famílias. Quando pensamos nos grandes personagens masculinos da Antiga Aliança, somos capazes de imaginá-los em guerras e conclaves, mas cada mulher nos aparece relacionada diretamente aos de sua casa. Ainda vai levar muito tempo para que os homens aprendam que as lutas que realmente importam são aquelas que precisamos vencer no seio de nosso lar.

O Novo Testamento não nos deixa sem nossas musas. Ele nos apresenta Isabel, mãe se João Batista; Priscila, esposa de Áquila e Lóide, avó de Timóteo. Mas entre todas as mulheres encontradas nas Sagradas Escrituras, nenhuma resplandece como a Virgem Maria. Gosto de pensar que Deus, na eternidade, ao planejar redimir o mundo de seu estado de perdição e de pecado, decidiu que o seu Filho não teria só dissabores nesta terra, não viveria só de ingratidão e de humilhação. Quis que ele conhecesse o bem mais sublime que em toda criação é possível vislumbrar: o colo de uma mulher: mundo de aconchego e de paz, fonte de segurança e conforto, recanto de amor e de alegria. Nada se compara a um colo de mulher.

Quando penso na rudeza e pobreza do presépio, creio que os nossos olhos se enganam. Não fora o Pai tão cheio de desconsideração para com seu Unigênito, que o enviou para nascer numa estrebaria e repousar numa manjedoura. Todos estes elementos, presentes na natividade, foram eclipsados pelo colo de Maria. Foi nele que Jesus foi recolhido ao nascer, seu primeiro berço foram os braços de sua mãe. Neste sentido, nem mais pobre nem mais rico que qualquer um de nós. Pois a fortuna com que abençoou o Redentor, Deus nos aquinhoou também. Sou grato pelo colo que me recebeu e me recebe, nunca indisponível a mim.

As mulheres, passados tantos milênios, realizadas tantas conquistas e avanços políticos, econômicos e sociais, continuam seres frágeis e doces. Quem dera permanecessem sempre assim. Sinto-me feliz por ver que já não resistem em nossos dias aquelas figuras estranhas que militavam no feminismo das décadas de 70 e 80, caricaturas de homens, copiavam nossos piores defeitos enquanto maquiavam, desnecessariamente, suas maiores virtudes. A feminista de hoje é feminina também. E há muito pelo que lutar e pelo que chorar. Lamentar pelos homens que continuam falando a linguagem bestial da violência, na ignorância de que proteger a mulher é cuidar do útero da existência, do olho d’água da vida humana.

Sei que um dia partirei desta estrada tão acidentada e desértica. Irei, conduzido por anjos, ao encontro dos santos do passado. Serei recebido no habitat celestial, todo adornado de ricas pedras e imarcescíveis flores. Ao chegar na morada dos espíritos, onde as antigas canções são entoadas por perfeitas vozes, farei, então, a mais surpreendente de todas as descobertas, sempre silenciosamente suspeitada, mas nunca, nem agora, confessada. Dar-me-ei conta, ao lado de meus irmãos, que há mais de mulher em Deus do que tiveram coragem de conjeturar os teólogos e proclamar os profetas. Posto que sei que serei abraçado e um melódico som de muitas águas pronunciará meu nome e me contará da saudade que sentia e o desejo ardente que premia de se encontrar comigo. Estará descoberto, então, que o céu, o verdadeiro céu, nem é um palácio nem um casarão, não é feito de nuvens nem de algodão, é só um coração... um coração de mulher.

Com carinho,

Martorelli Dantas
martorelli@martorelli.org

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